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Evento realizado pelo Movimento Intersindical Unificado de Jundiaí e região comprova que reformas promovidas pelo governo Temer tem como objetivo desmobilizar trabalhadores e enfraquecer a luta por direitos

O Movimento Intersindical Unificado de Jundiaí e Região realizou nesta sexta-feira (16) seu primeiro seminário, abordando as ameaças aos direitos trabalhistas e previdenciários com as reformas que tramitam em Brasília. Para falar sobre esses ataques do governo Temer contra trabalhadores e aposentados e o papel dos sindicatos, o Movimento convidou o juiz do Trabalho e doutor em Direito pela USP, Jorge Luiz Souto Maior, e o presidente do Diap, Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.

Douglas Yamagata, presidente do Sindicato dos Bancários e Fé Juncal, presidente da Associação dos Aposentados, ambos representando Jundiaí e região, foram os anfitriões do evento que reuniu membros das 13 entidades do Movimento Intersindical, representantes de movimentos sociais e os vereadores Paulo Malerba (PT) e Marilena Negro (PT).

Douglas abriu o evento lembrando dos ataques promovidos pelo governo Temer contra os trabalhadores. “O objetivo desse governo ilegítimo é transformar direitos básicos como educação, saúde e aposentadoria em mercadoria. Ou seja, viveremos em um país, onde o povo não terá nenhum poder e servirá simplesmente força de trabalho a ser explorada, sem direitos e salários baixos”, disse Douglas. Segundo ele, a lógica das grandes empresas e do capital financeiro é minimizar custos e maximizar lucro. “Para isso, eles estão dispostos a tudo, sem dó e nem perdão. Sem moral e sem ética”.

A presidente da Associação dos Aposentados disse que o texto aprovado pelo CCJ, Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, dando parecer favorável ao trâmite da Reforma da Previdência, é extremamente rígido. “O mais triste em tudo isso é ver que a categoria não está entendendo o que de fato vai ocorrer. Nossa perda será imensa e esse foi um dos motivos para unirmos nossa Associação e os sindicatos da região a fim de fortalecer nossa luta e tentar divulgar informações reais sobre todo esse retrocesso que nos está sendo imposto”, disse Fé Juncal.

A palestra do juiz Souto Maior foi o grande destaque do encontro. Mestre, doutor e professor na USP, o juiz, que atua no Fórum do Trabalhista de Jundiaí, é nacionalmente reconhecido por enfatizar o caráter humanista do direito do trabalho. Em todas as oportunidades ele ressalta ser totalmente contrário à tendência flexibilizadora da legislação trabalhista, a exemplo da terceirização, que há anos ele contesta, afirmando que sua ampliação vai precarizar ainda mais a vida dos trabalhadores. Dos 50 milhões de trabalhadores no país, hoje já são mais de 12 milhões atuando como terceirizados. “Essa reforma vem para fragilizar ainda mais a relação da classe trabalhadora, quebrar vínculos e fazer com que o trabalhador passe a não compreender mais a questão coletiva. Faço questão de dizer a todo momento: estamos correndo um sério risco”.

Revanche contra os avanços

Souto Maior analisa o momento que o país atravessa afirmando não haver apenas um componente conservador muito forte, mas uma verdadeira revanche contra os avanços conquistados nos últimos anos. “Não se trata de apenas impor uma pauta de menos estado e de mais iniciativa privada. Na verdade querem impor um retrocesso. É uma questão cultural que conta com 400 anos de escravidão e que ainda está presente entre nós com a lógica escravista, machista. É uma intolerância que se expressa nessa tentativa de superar esses avanços”.

Para o juiz, a crise que se instalou no mundo é uma crise do Capital e que sacrifica a todos. “Esse horror todo que estamos vendo tem dois componentes: dinheiro e poder. Quando nos perguntamos de onde saiu tanto dinheiro da Odebrecht, por exemplo, temos que lembrar que isso tudo é fruto de anos e anos de exploração da classe trabalhadora”, disse, ressaltando que o país todo fala sobre a corrupção, mas se esquece do “furto inicial” que vem da exploração do trabalho.

Para ele, a classe trabalhadora foi vítima de um golpe de estado, e uma das razões é por ter se fragilizado e perdido seu poder de mobilização. “Nos anos 90 esse golpe não aconteceria porque os trabalhadores estavam mobililzados”, avalia.

Se esse é o momento em que a direita conservadora encontrou para retirar direitos, é também o momento propício para colocar nossas riquezas e patrimônios à venda. “Se a Previdência fosse de fato deficitária não haveria tantas empresas querendo se apropriar dela”, afirma o juiz.

A meta é desmobilizar

Projetos como a terceirização e o negociado sobre o legislado foram criados para desmobilizar e pulverizar a classe trabalhadora. “Vão difundir a ideia de que se há desemprego é porque  há muitos direitos e que a forma de manter o emprego é retirando esses direitos”, disse o juiz, lembrando que no final das contas vão também alegar que os sindicatos são culpados por esse processo. Inclusive, um dos objetivos do governo Temer é acabar com o direito de greve. “A meta é desmobilizar. E uma classe pulverizada luta como?”, questiona Souto Maior.

Mas ainda que enfrentemos um momento de derrocada de direitos, o juiz acredita que esse retrocesso não passará incólume pela sociedade brasileira. “A concorrência com a grande mídia é imensa, porque há uma informação propositadamente distorcida, mas os movimentos sociais e os sindicatos já estão se mobilizando fortemente desde 2015. Eu tenho a perspectiva de que vai haver uma grande resistência. Esse é o momento para termos forças e enfrentar esse retrocesso”, conclui.

Uber e Zero Hora

Durante o debate, o presidente do Diap, Celso Napolitano, lembrou que em outros países já existe o chamado trabalho intermitente, no qual o trabalhador é remunerado e tem seus direitos e benefícios pagos somente pelas horas trabalhadas ou por produtividade. “Isso é ainda pior do que a terceirização”, disse. Segundo ele, redes como McDonalds, já operam com esse sistema.

Na Câmara dos Deputados existem várias matérias em tramitação que pretendem adotar o modelo de contratação de trabalho intermitente ou de curta duração. O modelo defendido pelos patrões pretende precarizar ainda mais as relações de trabalho nas áreas de comércio e serviço, criando categorias de trabalhadores diferenciados dos contratos com as regras gerais estabelecidas pela CLT. Paulo Mendonça, diretor do Sindicato dos Bancários, disse que a  Caixa Econômica Federal também está criando o regime do ‘caixa minuto’, acabando com os cargos do caixa executivo.

O Uber, criado nos Estados Unidos e que funciona como uma “carona remunerada”, também levantou discussão durante o encontro. Um operador do sistema, que funciona através de aplicativo, questionou se o avanço tecnológico não é irreversível e uma prática a ser adotada por outras empresas.

Para Souto Maior, a realidade que se apresenta só será irreversível se os trabalhadores se acomodarem a ela. Segundo ele, a tecnologia ser inevitável é uma coisa, mas as condições de trabalho determinadas pelo Uber é outra.”O Uber é um empregador como outro qualquer, que determina e subordina. Essa empresa que detém os direitos do Uber pode ser inserida numa lógica jurídica como empregadora. Ou seja, os trabalhadores podem inclusive pleitear vínculo”, explica o juiz.

Sobre o contrato de zero hora, Souto Maior diz que o sistema não é só uma questão jurídica, mas de perversidade. “Não faz o menor sentido uma empresa milionária como o McDonalds e um banco público agirem desta forma. É como se dissessem: Nós temos o poder e vamos fazer qualquer coisa”. Mas ele alerta que tais processos acabam criando uma insegurança jurídica para as empresas. “O direito acaba enquadrando essas realidades como fez com o telemarketing”.

O papel dos sindicatos

Celso Napolitano diz que o momento exige maior força e atuação dos sindicatos. “Quando vocês forem à Brasília, não participem somente das manifestações. Entrem nos gabinetes dos deputados, procurem os senadores, exijam que os direitos dos trabalhadores sejam mantidos e ampliados”.

Para Souto Maior, do ponto de vista jurídico, sindicatos, juízes e advogados têm falhado há muito tempo e que é necessária uma reflexão crítica. “Não temos que lutar contra a ampliação da terceirização. Temos que ser contra a terceirização e ponto. O FGTS não é um direito opcional. É um adicional. Sobre demissões, não basta pedir indenização. É preciso exigir a reintegração do trabalhador”, disse, referindo-se à Convenção 158 da OIT, que, entre outras ações, impede a dispensa arbitrária de trabalhadores.

Disposição para lutar

O juiz Souto Maior avalia que criação do Movimento Intersindical Unificado é efeito de grande importância na atual conjuntura. “Vejo que as pessoas estão dispostas a defender causas justas. Há uma predisposição  para a luta que talvez não acontecesse há alguns anos”.

O juiz lembra que nenhuma empresa produz capital. “Quem trabalha é que produz o capital. Se os trabalhadores pararem, toda a produção para. E é por isso que nos questionamos: por que a classe trabalhadora precisa sofrer tanto? Basta ter a compreensão de que é ela de fato que detém os rumos da história”.

Texto: Equipe Tarantina de Comunicação

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