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Pressão popular: Governo recua de decreto que quer ‘desmontar coração’ do SUS. ‘Bolsonaro desgoverna’

Apesar da pressão popular, recuo também pode ser visto como uma estratégia para não prejudicar aliados de Bolsonaro que disputam as Eleições municipais no próximo dia 15 de novembro.

Um dia depois de publicado e ter provocado uma onda gigantesca de manifestações de repúdio, o presidente Jair Bolsonaro recua. Bolsonaro revogou hoje (28) o Decreto 10.531, que previa “estudos” para transferir as Unidades Básicas de Saúde (UBS) do país à iniciativa privada. Em suas redes sociais, Bolsonaro tentou negar que o decreto mirava a privatização da saúde pública, afirmando que “o espírito do Decreto 10.530, já revogado” seria a conclusão de obras inacabadas de UBS pelo país.

Não colou. Também no Twitter, foram várias as manifestações que traduziram o repúdio imediato à ideia de entregar o SUS ao setor privado, que faz da atenção à saúde uma mercadoria, não um serviço público. O presidente nacional da CUT, Sergio Nobre, afirmou: “E mais uma vez Bolsonaro vem às redes dizer que não fez o que um decreto oficial revela que ele fez”, escreveu. “Bolsonaro desgoverna”, afirma Nobre.

Por que Bolsonaro recua?

Para o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, que classificou de “assustador” o teor do decreto, Bolsonaro recua devido à forte mobilização popular para manter o maior sistema de saúde pública do mundo acessível a todos os brasileiros. “Nossa luta fez Bolsonaro recuar desta absurdo”, escreveu.

Para o CNS (Conselho Nacional de Saúde), o decreto representa uma ameaça à universalidade do atendimento à saúde, prevista na Constituição.

Em um vídeo publicado na página do CNS no YouTube, o presidente do órgão, Fernando Pigatto, classifica a medida do presidente como “arbitrária”.  “Vamos tomar as medidas cabíveis. Precisamos fortalecer o SUS contra qualquer tipo de privatização e retirada de direitos”.

Apesar da pressão, recuo também pode ser visto como uma estratégia para não prejudicar aliados de Bolsonaro que disputam as Eleições municipais no próximo dia 15 de novembro.

Postagem do ex-ministro da Saúde alerta sobre práticas do governo que escondem ações oficiais

Para Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o decreto, derrotado em sua origem, “desmontava o coração do SUS”. “A atenção primária (papel das UBS) é totalmente gerida e ofertada pelo setor público, organizada em rede, gerida pelo gestor público. Perderia (com a privatização) o caráter público e a possibilidade de que a gente mantivesse um SUS integral e universal”, afirma.

A lógica do decreto, concebido pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia), seria, em última instância, entregar o sistema fatiado a planos de saúde diferentes, desintegrando a estrutura da saúde pública do país. Um retrocesso que, como observa Gulnar, não passou por avaliação do controle social, Conselho Nacional de Saúde ou nenhuma outra representação da sociedade. “Era uma proposta do Paulo Guedes na linha de privatização.”

Teto de gasto precisa acabar

O próximo passo, diz a dirigente, é a luta pelo fortalecimento e ampliação do financiamento do SUS, com o fortalecimento das UBSs. Para isso, a primeira medida é suspender a Emenda Constitucional 95, que instituiu o teto de gastos.

“Não há como enfrentar a crise sem eliminar as amarras que impedem o Estado de ampliar seus gastos. É urgente começar pelo aumento da tributação da renda e patrimônio, pondo fim às subvenções fiscais”, defende a Abrasco no documento  “Fortalecer o SUS, em defesa da democracia e da Vida” (leia aqui).

No documento, a entidade defende a imediata revogação do teto de gastos. Isso porque, como diversos analistas vêm observando, o atual estado de calamidade pública é previsto para durar até 31 de dezembro e permite o descumprimento de limites de gastos da máquina estatal.

Paulo Guedes já informou que o teto de gastos volta em 2021. Mas, como diversos especialistas observam, a pandemia não acaba em 2021. Além disso, a crise econômica se aprofundou em 2020 e continuará no ano que vem. “Em um cenário sombrio (com a pandemia de covid-19) no país e de recrudescimento da crise social e política, é urgente somar forças na defesa da Seguridade Social que está na Constituição”, diz a Abrasco. Ao contrário da ideia expressa pelo governo no decreto revogado, “a expansão da pobreza, da desigualdade e da insegurança laboral requer a ampliação da proteção social.”

Saúde sob ataque

Para Gulnar, é irônico que o governo fale em melhorar a eficiência do SUS utilizando planos de saúde. “O SUS é o maior sistema público de saúde pro mundo.” Ela exemplifica com a  medicação contra Aids, fornecida gratuitamente aos pacientes, assim como contra tuberculose, leishmaniose e malária.

“A gente consegue controlar a tuberculose e a Aids porque damos acesso gratuito à medicação. O programa da Aids é um exemplo maravilhoso de programa exitoso no mundo”, diz a presidente da Abrasco. Segundo ela, o programa continua, mas sob ataque. “Esse governo atacou a política de atenção primária, de saúde mental, muito exitoso no Brasil. Em vacinação, vemos o que acontece, com desabastecimento e queda de cobertura. O governo vem atacando passo a passo.”

Fontes: RBA e Catraca Livre

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