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Entenda as mudanças que o chamado PL do Veneno pode causar

“Substâncias com estas características [carcinogênicas], nos termos do PL, poderão ser registradas. A proibição de registro é substituída pela definição de ‘risco inaceitável'”, disse em nota o MPF

 

Foi aprovado na quarta-feira (9) na Câmara dos Deputados, por 301 a 150 votos, o texto-base do PL (Projeto de Lei) 6.299, de 2002. O projeto, que preocupa entidades ambientais e de saúde, aumenta o poder do Ministério da Agricultura no processo de autorização para novos agrotóxicos.

Veja abaixo as principais mudanças trazidas pelo PL, que retorna ao Senado para votação, e os pontos tidos como problemáticos por entidades ambientais e de saúde.

O QUE MUDA COM O PL?
O projeto altera a lei 7.802, de 11 de julho de 1989, que trata desde a pesquisa até a comercialização, os registros e a fiscalização de agrotóxicos.

Um dos pontos de mudança previstos no PL é, inclusive, a própria palavra “agrotóxico”. No projeto, os produtos recebem o nome de “pesticidas”. Segundo o relator do projeto, o deputado Luiz Nishimori (PL-PR), o termo agrotóxico seria “depreciativo”.

Um ponto central do PL que tem, há anos, chamado a atenção é a responsabilidade da aprovação de agrotóxicos ficar nas mãos do Ministério da Agricultura.

Enquanto isso, o artigo 3º da lei atual determina que os agrotóxicos só podem ser produzidos e utilizados “se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura”.

Assim, no modelo atual, o trabalho envolve também a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Segundo uma análise feita pela Fiocruz, em 2018, a alteração promove um “desmonte do [atual] sistema de regulação tríplice”.

A análise afirma que o modelo tripartite é uma estratégia que minimiza a possibilidade de as agências “agirem para atender exclusivamente” aos interesses econômicos do setor regulado.

Os pesquisadores da Fiocruz dizem ainda que, com as mudanças feitas pelo PL, a Anvis passa a ter “papel meramente consultivo, abrindo possibilidade para que as decisões que deveriam ser técnicas estejam nas mãos do mercado”.

Pelo PL, o processo de reanálise (que pode ser derivado de alertas ou do desaconselhamento de uso de pesticidas por organizações internacionais) de agrotóxicos já liberados também fica sob responsabilidade do Ministério da Agricultura, que “poderá solicitar informações dos órgãos de saúde e de meio ambiente para complementar sua análise”.

COMO FICA A ATENÇÃO AOS RESÍDUOS DE AGROTÓXICOS EM ALIMENTOS?
O monitoramento de resíduos em alimentos, caso o PL entre em vigor como está, será feito em conjunto com o Ministério da Saúde, mas a divulgação dos resultados ficará a cargo somente do Ministério da Agricultura.

Atualmente, a Anvisa coordena o Para (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos), que foi criado em 2001 para uma avaliação periódica de níveis de agrotóxicos em alimentos.

SUBSTÂNCIAS COM POTENCIAL DE CAUSAR CÂNCER PODEM SER LIBERADAS?
A palavra câncer —ou correlatas— não aparece no projeto de lei aprovado na Câmara. Na lei atual, há uma proibição expressa a agrotóxicos, seus componentes e afins que “que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de experiências da comunidade científica”.

O PL aprovado aponta a proibição de agrotóxicos que, “nas condições recomendadas de uso,
apresentem risco inaceitável para os seres humanos ou para o meio ambiente”.

A definição de “risco inaceitável” dada pelo projeto é ampla: “nível de risco considerado insatisfatório por permanecer inseguro ao ser humano ou ao meio ambiente, mesmo com a implementação das medidas de gerenciamento dos riscos”.

O Inca (Instituto Nacional de Câncer), parte do Ministério da Saúde, manifestou-se contra a aprovação do PL em 2018, outro momento em que o projeto esteve em discussão.

De acordo com o Inca, o PL possibilita “o registro de agrotóxicos com características teratogênicas, mutagênicas e carcinogênicas, colocando em risco a saúde da população exposta a esses produtos e o meio ambiente”.

O Ministério Público Federal foi mais um a se posicionar contrariamente, em nota técnica de 2018, contra as mudanças.

“Substâncias com estas características [carcinogênicas], nos termos do PL, poderão ser registradas. A proibição de registro é substituída pela definição de ‘risco inaceitável'”, disse em nota o MPF.

AGROTÓXICOS PARA EXPORTAÇÃO PRECISARÃO DE REGISTRO?
Ao contrário do que acontece atualmente, o PL, caso aprovado, aponta que não será necessário o registro ou mesmo estudos agronômicos, toxicológicos e ambientais para a exportação de agrotóxicos. Segundo o projeto aprovado na Câmara, somente uma comunicação ao Ministério da Agricultura será suficiente.

Segundo a avaliação da Fiocruz, a ausência de registro “negligencia os efeitos sobre a saúde dos indivíduos envolvidos em seu processo produtivo, incluindo produção, armazenamento, transporte e demais atividades correlatas, além dos potenciais danos ao ambiente”.

É POSSÍVEL USO DE AGROTÓXICOS EM ÁREAS URBANAS?
A lei atual cita o uso de agrotóxicos em ambientes urbanos e industriais. O PL aprovado se distancia disso ao apontar que os pesticidas “destinados ao uso nos setores de proteção de ambientes urbanos e
industriais são regidos pela Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976”.

Em 2018, esse já era um dos pontos criticados pela Fiocruz. Segundo a entidade, a redação do PL exclui o entendimento tácito de que “produtos formulados com ingredientes ativos de agrotóxicos”, mesmo quando direcionados para ações inseticidas, como controle do mosquito Aedes aegypti, “apresentam as mesmas propriedades toxicológicas que os agrotóxicos” e, assim, devem ser “tratados com o mesmo rigor”.

EM QUANTO TEMPO PEDIDOS DE REGISTRO DE AGROTÓXICOS DEVEM SER ANALISADOS?
A demora para análise e registro de novos agrotóxicos —alguns dos quais, inclusive, poderiam ter características menos nocivas à saúde humana e ao meio ambiente— tem sido uma reclamação entre pessoas que atuam na área e representantes do setor.

Nos últimos anos, porém, a análise de pedidos foi acelerada e, recentemente, têm sido observados grandes números de registros.

O PL indica um tempo para a conclusão de análise de registro. Variando entre diferentes categorias de produtos, o máximo para conclusão do pleito é de 24 meses, para produtos novos formulados e técnicos.

O menor tempo é de 30 dias, para o chamado registro especial temporário (para pesquisa e experimentação) e para processos de reanálise de riscos.

fonte: Folha de S. Paulo

 

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