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Jundiaí numa escalada autoritária

Em votação na Câmara, vereadores aprovam ‘Escola Sem Partido’ e proíbem a discussão da diversidade e de gênero nas escolas

Na noite desta terça-feira (26) Jundiaí mais uma vez tornou-se protagonista em nível nacional no quesito retrocesso. Após aparecer em todas as mídias por decisão da justiça em censurar uma peça teatral, ontem a Câmara Municipal deu sua cartada final com a aprovação do projeto “Escola Sem Partido”, que elimina a discussão crítica de temas em sala de aula, sob uma falsa ideia de neutralidade.

O projeto de autoria do vereador Albino (PSB) foi aprovado por 11 votos a 7. Na mesma noite, numa manobra golpista, os vereadores aprovaram – dois turnos – uma emenda à Lei Orgânica do vereador Gastaldo (PTB) que proíbe a discussão de gênero em salas de aulas do município.

Paulo Malerba, diretor do Sindicato dos Bancários de Jundiaí e região, doutorando em Ciência Política pela Unicamp, avaliado como melhor vereador pelo Movimento Voto Consciente no último mandato, explica quais os riscos de um projeto como esse para a educação e o avanço da cidade.

  1. O que a aprovação do ‘Escola Sem Partido’ representa para Jundiaí?

Sob o aspecto legal, ele não tem validade, pois é inconstitucional. Ele torna-se um problema, pois já tem sido utilizado para criar um estereótipo dos professores, caracterizando-os de maneira negativa e serve para perseguição aos profissionais da educação. É um projeto que chamamos “copia e cola”, cujo autor reproduziu o projeto pronto em nossa cidade. Seus autores não tem conhecimento, nem vivência na área de educação. Estão criando factóides e manipulando a opinião pública para impor a visão de mundo deles, que é conservadora.

  1. Como esse projeto seria colocado em prática em nossa cidade?

Eles buscarão colocar por meio do medo, da auto-censura dos professores, do constrangimento e impelindo os pais a protestarem sobre qualquer pretexto, quando uma informação não coincide com a opinião deles. Por exemplo, se um professor criticar a ditadura militar, com razão, devido às violações que ela causou, tanto aos direitos civis e políticos, eles vão protestar, alegando que isso não pode, pois, para eles a ditadura foi positiva e isso deveria ser dito. Eles desprezam o conhecimento histórico consolidado.

Há como reverter?

Certamente iremos derrubar a lei na justiça, baseando-se na constituição e na jurisprudência. Preocupa-nos mais a questão política do tema, sua utilização nefasta para perseguição.

  1. A sociedade consegue compreender que o projeto tornou-se um instrumento de disputa política?

O nome “escola sem partido” é ardiloso, ao pressupor, falsamente, que seu contrário é a escola “com partido”. O contrário é a escola plural, diversa, com ensino, debate, liberdade de aprender e ensinar, como diz a constituição. Os professores já seguem o programa e a grade curricular estabelecida pelas secretarias de educação com base na LDB (Lei de Diretrizes e Bases). Não existe o que eles chamam de doutrinação. Os alunos aprendem com os conteúdos programáticos da escola e com a vivência em vários espaços, nas famílias, internet, amigos, televisão, igreja. É um absurdo induzir as pessoas a pensarem que os alunos são passivos, como se fossem seres não-pensantes e que qualquer discussão que ouçam irá distorcer a construção de seu conhecimento.

  1. Por que a direita teme tanto a discussão sobre assuntos envolvendo gênero e sexualidade nas escolas?

Tornou-se um instrumento de disputa política, acima de tudo, então a direita conservadora cria mistificações sobre o assunto de forma a contrapor e desvalorizar a diversidade e o respeito. Eles usam de muitas mentiras e manipulações para polarizar e se organizar em torno de uma disputa, na qual o interesse deles é o poder. Esse tema é sensível para algumas pessoas em igrejas, principalmente, então esses políticos e alguns líderes religiosos valem-se do discurso do medo para se impor e assustar as famílias.

Discutir diversidade e a sexualidade nas escolas, é uma forma de impedir o preconceito e a violência sexual. Por exemplo, já está provado que a grande maioria dos casos de abuso acontecem no âmbito das casas, cometido por pessoas próximas às crianças e às mulheres. A escola deve ser um lugar onde os estudantes tenham esse conhecimento e sintam-se seguros. Muitos dos casos de violência em casa são descobertos por professoras, ao notarem o comportamento ou as marcas nos alunos.

Por que Jundiaí tem sido protagonista de tantos eventos marcados pelo retrocesso?

O prefeito de Jundiaí e muitos vereadores têm estimulado esse discurso do medo e do preconceito. Isso se reflete em outras instâncias da vida cotidiana.

  1. O que a sociedade jundiaiense pode fazer para ajudar a reverter esse processo?

As pessoas devem se informar, procurar dados reais. Um grande problema é se informar apenas pelas redes sociais, através de “memes”. Infelizmente, a internet virou espaço em que muitos propagam ódio e mentiras. As pessoas precisam ser cautelosas, dialogar com tranquilidade e buscar informações reais, baseada no acúmulo de conhecimento sério que a sociedade possui. Respeitar e valorizar as professoras e professores é o começo para se buscar uma sociedade melhor.

fonte: Seeb Jundiaí

 

Paulo Malerba é diretor do Sindicato dos Bancários de Jundiaí e região, doutorando em Ciência Política pela Unicamp e avaliado como melhor vereador pelo Movimento Voto Consciente no último mandato.

 

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